sexta-feira, 19 de dezembro de 2008

Poesia sutil de Priscila Figueiredo



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Priscila Figueiredo fez Letras na USP e mestrado na área de literatura brasileira, sobre o livro de Mário de Andrade Amar, verbo intransitivo. A dissertação veio a ser publicada, em 2001, pela editora Nankin. Escreveu vários artigos para revistas e jornais, como a Folha de S. Paulo, onde foi, por quatro anos, consultora de português. Foi co-editora da revista Rodapé, voltada para a crítica de literatura brasileira contemporânea. Participou do Cálamo, grupo surgido em fins de 1990 a partir das oficinas literárias da Casa Mário de Andrade, integrado por pessoas de diferentes formações interessadas em produzir e discutir literatura. Desde 1998 trabalha na TV Cultura como assessora em língua e literatura, produzindo análises de poemas e canções para a seção "ponto.compoesia", do site de educação, e colaborando na pauta e redação do programa "Nossa Língua Portuguesa". Atualmente faz doutorado na USP sobre Macunaíma.
“Sutil, inteligente, reflexiva e de uma delicadeza pontiaguda” é a definição da poesia de Priscila Figueiredo para Reynaldo Damazio, da Unimarco Editora, para quem a autora apresenta uma visão interessante da literatura. Mas é a ironia e o tom satírico que marcam a atual fase de Priscila, que escreve poemas há 20 anos. “Já passei pela fase de poemas místicos, líricos, até atingir um ponto mais consistente, atualmente, com uma fase satírica”, disse ela.
“ As Anãs São Sempre Pobres...”
As anãs são sempre pobres
é incrível
minha mãe é cobradora
de ônibus e anã
ela fica sentada ninguém nota
com catraca eletrônica
a gente está perdida
no olho da rua
a gente vai comer o diabo
todo mundo vai saber
que minha mãe é anã
e pobre
a mão invisível só atrapalha
o único emprego que esconde minha mãe
é o de cobrador ela fica sentada
ninguém vê ou tem tontura
porque suas mãos grandes e rápidas
pegam o dinheiro e o contam e o recusam
quando ela não pode dar o troco
são mãos que não trazem perigo
esse trabalho era mesmo muito bom
porque a gente só podia ver as mãos dela
agora essas mãos andam em companhia do corpo
e vão lhe dizer: “Olhem com quem andam!”

O corpo da minha mãe não é estável

Tatu-bolinha

Você se eriça
Você se eriça todo
mas nem por isso
toma jeito
Assim é que ao preferir se dobrar
não dá margem para mim
não tenho simplesmente por onde
pegar as perninhas
alisar o seu oco
ou o seu
preenchimento – pense bem
isso é desesperador
Mas não pense
fique esférico
estratégia excelente para encolher
minha palavra desenvolvida

Luta de Classe I

Jandira insiste com a creolina
que a tudo corrói, limpa e higieniza
Jandira, até minhas tripas?
Depois pego Jandira na despesa
devorando mexericas quase podres
arrastando no chão sujo a bunda e o avental
praticamente novo

Jandira
na geladeira
o melão partido
a alface crestada
o molho branco destampado?
Jandira diabólica
trepa na minha vista
arreganha os dentinhos
criada surda curda fula
Jandira enfia no meu cu
o avental a creolina as cascas
eu engulo mais essa
fedentina de mexerica porcaria
dessa empregada
mole e revoltadinha
que empesteia de mexerica
toda a minha casa
toda a minha cozinha

Amor Imposível

Andréia é louca por melancia, manga e goiaba
mas Andréia tem grande preguiça
de comer melancia com tantas sementes!
Para Andréia, não há graça
em comer manga com faca
(e comer manga sem faca
é mesmo uma desgraça)
Andréia também não come goiaba
porque diz ela, são tantos os bichos...

Apesar disso
Andréia é louca por melancia, manga e goiaba

Canto da Sereia

Meu querido
este umbigo que vês
é o seu tanto soturno e pequenino
mas é odre de almíscar
celeiro de tigres
terra da Úmbria
é ainda
cantil de poeira
boca sem visgo
minha cicatriz mais triste

possa tua língua
escovar bem fundo
esse poço sem limo
este ponto de fuga
esta galinha morta
encruzilhada suja
em que se enruga
toda a Terra, toda a carne:

pelo ralo

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