segunda-feira, 25 de outubro de 2010

Almira Rodrigues: Afetos & Palavras



Salvador Dali - Metamorfose de Narciso
Almira Rodrigues nasceu no Rio de Janeiro, em 13 de setembro de 1953. Filha de parnaibanos foi ficando um pouco piauiense. Morou em Belo Horizonte por muitos anos e desenvolveu também um jeito mineiro de ser. Em Brasília passou o maior tempo de sua vida. Aqui teve seu filho e depois ganhou duas netas. Formou-se em Sociologia pela UnB, onde fez seus estudos de pós-graduação. Em sua dissertação de mestrado desenvolveu uma análise sociológica sobre as relações amorosas e na tese de doutorado pesquisou sobre cidadania e políticas públicas no âmbito das relações afetivo-sexuais. Trabalhou com políticas sociais em instituições públicas e integrou a ONG Centro Feminista de Estudos e Assessoria - CFemea. Atualmente faz formação psicanalítica no Instituto de Psicanálise Virgínia Leone Bicudo, da Sociedade de Psicanálise de Brasília. Publicou Afetos & Palavras (Poesias), Editora Abaré. Brasília, 2009.

Para o poeta Luiz Turiba, “Palavra é a ferramenta, o batom na boca desta carioca-mineira-brasiliense que herda em seus poemas uma certa síntese cínica & mineiríssima de Adélia, uma sabedoria à moda antiga de Cora e/ou uma transcendência juvenil de Ana Cristina Cesar. Foi nessa pescaria que ela criou seu poemário.”

a
comodações

acomodo palavras em afetos
acomodo afetos em palavras
e ainda assim
faltam palavras e sobram afetos


bordado

desejo atravessado
contido
engasgado
não desce
nem vai embora
fica ali
enquanto isso
gestos trans/bordam

centroavante

minha história de amor não começa com você
você não é o início
e provavelmente não será o fim
mas de certo
hoje você é o centro

desejo

você esteve de passagem
deixou o alimento
e o desejo à vista
pendurado no varal
fico embebida por seus movimentos
crio linhas e linhas de caminhos até você
fico toda enrolada
bom será
que você também
fique enrolado em mim

espelhos

fostes um grande espelho
também fui
em nossas andanças de alargamento e vastidão
nos enxergamos um no outro
e no entanto
queríamos ser mais do que espelhos

fantasmas

alguns afetos
precisam de palavras para tomar corpo
senão viram fantasmas

pinturas

pedaços de dor em chamas
camadas infinitas de véus
sonhos sonâmbulos
formas disformes
corpos contorcidos
desertos grutas crateras
suas pinturas em mim

21

bichos me habitam
aparecem de noite
de dia se recolhem

69

virar poeta
é abrir uma loucura branda

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