terça-feira, 1 de outubro de 2013

Fragmento (Cantares/Ezra Pound)


 
O que amas de verdade permanece,
                                                        o resto é escória
O que amas de verdade não te será arrancado
O que amas de verdade é tua herança verdadeira
Mundo de quem, meu ou deles
                                       ou não é de ninguém?
Vejo o visível primeiro, depois o palpável
       Elísio, ainda que fosse nas câmaras do inferno
O que amas de verdade é tua herança verdadeira
O que amas de verdade não te será arrancado

A formiga é um centauro em seu mundo de dragões.
Abaixo a tua vaidade, nem coragem
Nem ordem, nem graça são obras do homem,
        Abaixo tua vaidade, eu digo abaixo.
Aprende com o mundo verde o teu lugar
Na escala da invenção ou arte verdadeira,
Abaixo tua vaidade,
                                Pasquim, abaixo!
O elmo verde superou tua elegância.

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

Dina Brandão

 

Dina Brandão nasceu no Rio de Janeiro. Em Brasília desde 1968. Estudou música, ballet clássico e outros estilos de dança; nas artes cênicas participou como atriz em diversas produções desde 1974. Formou-se em Artes Cênicas pela Faculdade de Artes Dulcina de Moraes. Em 1977, em parceria com Vicente Sá, publicou Ironia dos Deuses. Em 2011, pela Thesaurus Editora, publicou Do amor e seus descabelos (poesias, missivas, ensaios e um plano de voo).

Brasília

Brasília é minha filha,
minha menina sem juízo.
Sonhou tão alto
que criou asas
pra me ensinar a voar,
sair dos eixos,
imaginar esquinas,
sobrevoar monumentos.
com liberdade de meninos,
colorir o firmamento.
Na catedral tocar os sinos
na hora da Ave Maria
e depois sair correndo
para assistir o fim do dia
pousar nos meus olhos
e derramar toda a poesia
no Lago Paranoá.

Acrobacia

Socorro, Freud!
Socorro, Reich! Jung!

Eu estou aqui neste quarto,
quatro paredes sem quadro ou cor,
e, do ângulo de onde estou,
cometo a miragem de sombras líricas
que divergem pálidas
para a magia da noite eterna...

Mas saibam que minha loucura
é irmã gêmea de minha lucidez
ambas sempre siamesas,
trabalham juntas o meu equilíbrio.

Se uma se sobressai,
a outra me trai.
Se as duas se embaraçam,
eu tropeço, e às vezes, caio mesmo.

Mas nessa acrobacia,
eu consigo de mim,
sem muito sucesso,
a minha sensatez.

Mas no fundo, no fundo,
me sobra uma angústia.
E se as duas se separam,
e alguém as define?

Isolando suas funções,
eu perderia o meu equilíbrio
e cairia de boca
no abismo do conflito existencial.

E estando assim tão só, 
tão só, 
a louca de mim partiria, 
a lúcida com certeza se perderia.

E eu, acrobata,
despencada na solidão do caos,
tentaria o milagre
de assim
ser feliz.

Jejum

Laço com o meu olhar
tudo que me é aprazível
ao olfato e ao paladar.
às vezes a fome me engole
ora a gula me devora.

Falange Bege

Quando você me encara
com esses olhos de lobo, 
a minha boca escancara,
a alma covarde se agarra
com unhas e dentes ao corpo.

Quando seus olhos me abraçam,
com olhos que tens de louco,
o lobo de mim escapa
com calma libero a alma
e o corpo tremendo todo.

quinta-feira, 17 de maio de 2012




Recuerdo


O cão ilusório uiva

com cinco chuvas

canção chorando outubro


Verbo canastra


Delete texto pretexto

de encher lingüiça

sem cachorro por perto

preâmbulo necessário

de desancar o verbo


Otário eminente de surdina

metido a besta loquaz

arruma tempo para torrar a paciência

de quem evita jogar canastra

na casa da sogra caninana




quarta-feira, 2 de novembro de 2011

Hilda Hilst - Da morte. Odes mínimas



Hilda Hilst


Odes mínimas, de Hilda Hilst foi publicado pela primeira vez em 1980 por Massao Ohno/ Kempf Editores, além de ter constado da reunião Poesia (1959/ 1979), lançada também em 1980, pelo Instituto Nacional do Livro/ Edições Quíron.
Da morte. Odes mínimas vem acompanhado de seis aquarelas da própria Hilda Hilst. São aquarelas de cores vivas e alegres, enquanto os versos conversam com a negra morte. Tal paradoxo, obviamente proposital, vem afirmar que a poesia traz a morte para a ensolarada vida, procura envolvê-la, e, por esse caminho, o monólogo com ela se torna possível. Assim como, de tanto falar sobre algo, uma intimidade possa se estabelecer, o monólogo criado para a morte parece querer que ela, ao se apresentar finalmente por inteiro, já não seja capaz de causar espanto. Os versos da poeta traçam uma via que conduz ao encontro virtual "entre duas mulheres fortes/ na sua dura hora". Ou, já aprofundando o encontro: "E a ti, te conhecendo/ Que eu me faça carne/ E posse/ Como fazem os homens". Um conhecimento vai sendo travado, um envolvimento vai criando a trilha da sedução, enfim, as odes vão construindo um pacto com a morte.( Gerana Damulakis. http://leitoracritica.blogspot.com/2008/08/hilda-hilst.html )

(...)
É sempre a morte o sopro de um poema
entre uma pausa e outra ela surge
Ilharga de sol. Ah, diante do efêmero
hei de cantar mais alto, sem o freio
de cantares longínquo, assustado.
(...)
Um poeta e sua morte
estão vivos e unidos
no mundo dos homens

Ode XXVIII (Da morte)

Ah, negra cavalinha
Flanco de acácias
Dobra-te para a montaria
Porque me sei pesada
De perguntas, negras favas
Entupindo-me a boca
E no bojo um todo averso
Uns adversos de nojo:
Que rumos? Que calmarias?
Me levas para qual desgosto?
Há luz? Há um deus que me espia?
Vou vê-lo agora montada alma
Sobre as tuas patas? Tem rosto?
Dobra-te mansa
Porque me sei pesada. De vida.
De fundura de poço. E porque
Um poeta não sabe montar a morte
Ainda que seja a minha:
Flanco de acácias.
Negra cavalinha.

segunda-feira, 8 de agosto de 2011

DEZLOKADO - Marcos Fabrício Lopes da Silva





MARCOS para além da marcação, Fabrício para além da fabricação, LOPES para além do lapso, DA SILVA para além da selva de pedra. Poeta brasiliense afrobrasileiro e co-fundador da República do Pensamento, Jornalista formado no UniCEUB, Doutorando e mestre em Estudos Literários/Literatura Brasileira pela Faculdade de Letras da UFMG. Reside em Belo Horizonte.


A FOLHA E O LÁPIS

Viemos da mesma árvore,

mas somos frutos diferentes.

Nossos destinos se cruzaram

para que a obra-prima

não virasse só mais um rascunho.

Poderia te encher com os meus rabiscos,

mas prefiro traçar palavras bonitas

a fim de melhor gozar do teu espaço aberto e acolhedor.

Me agrada muito saber que,

ao ficares grávida dos meus sentidos,

os olhares dos curiosos ficam debruçados sobre ti,

conto que o segredo (e o encanto) da nossa relação

esteja no fato de que tudo entre nós foi sempre preto no branco.

Nossos contatos são tão marcantes

que não há borracha que os apague

e nem lixeira que os carregue para longe.

Tu guardas as nossas lembranças,

resistindo bravamente ao amarelo do tempo

enquanto eu driblo as ações do apontador

para curtir o maior tempo possível juntinho de ti.

Pintando o sete, riscamos o sofrimento do mapa,

e, de quebra, desliza em tua textura,

te fazendo cócegas e dengos.

Estou contigo até a última ponta. Registrado?


PARA-QUEDAS


Um para-quedas foi preciso para cair na tua vida.


Cheguei no teu coração. Remédio para antigas feridas.


Vivia nas nuvens até ter encontrado um pouso alegre.


Percebi que há uma outra forma de chegar às alturas:


é quando a minha língua alcança o céu da tua boca.


Em tua companhia, aprendi a não ter medo do chão


porque é nele que rola tudo entre a gente.




ELOGIO DO AMOR TOTAL( Na Levada de Camões)


Amor é agua que purifica sem precisar crer;


é cicatriz que cura e a ferida desmente;


é um inconformismo cpntente;


é remédio que a gente toma sem a bula ler




É um contra-poder mais que bem poder;


é ser solidário com quem não gosta da gente;


é sempre afinar-se com o coro dos descontentes;


é deixar a onda te levar sem o mas temer;




É querer estar condenado à liberdade;


é colher com quemse ama a lição da dor;


é não ter como obrigação a felicidade




Mas como ideal pode brotar a seu favor


mas corações humanos a sinceridade


se tão contrário, iludir é também Amor?




MENINO-AVIÃO


eixos que te quero asas


asas que te quero eixos


torto como o cerrado


desafio o plano arquitetado


prefiro experimentar


o plano-elevado


de ser o menino avião


que aprendeu a voar


com os pássaros


H20H!


Todo manda-chuva


chove no molhado.


Quem faz chover mesmo


é quem dá nó em pingo


d'água.


ALL STAR NA CIVILIZAÇÃO


João virou estrela

ao se enforcar em um cadarço

de um tênis surrado

de tanto correr atrás

de all star bem









Na Levada de CAMÕES

sábado, 7 de maio de 2011

FINCAPÉ Coletivo de Poetas







Lançamento FINCAPÉ Coletivo de Poetas - Biblioteca Nacional de Brasília, 5 de abril de 2011, fotos de Basilina Pereira


FINCAPÉ, publicada pela Thesaurus Editora em abril de 2011 é a sexta coletânea do Coletivo de Poetas, organizada por Menezes y Moraes. As outras antologias cooperativadas foram: Poemas(1990), Contos(1990), Outros Poemas(1992), Ibirapitanga(1994) e Mais Uns(1997). O Coletivo de Poetas existe há 21 anos, é pioneiro na realização de saraus no Distrito Federal e tem como filosofia o lema Poesia para Todos. Os 43 poetas que integram a coletânea FINCAPÉ, nas palavras de seu organizador, “celebram a Vida (seus encontros e desencontros), se indignam diante a miséria social e manifestam carinho por Brasília”.

No Mundo da Lua (Almira Rodrigues)

não sou bailarina
me falta equilíbrio
sou poeta
posso tirar os pés do chão
e ficar no mundo da lua

O Dorso da Palavra (Basilina Pereira)

O dorso da palavra me compele
a desvendar o mistério da tarde.
Aquele espaço que é de tempo,
de brisa
e ninguém sabe quanto vento ainda trará.
Se o ouro que transborda vem dos olhos
que garimpam emoções
ou dos versos que escondem o segredo das cores.
No poente, invento nuances até não ter mais tons
para rimar
E nos sons que ora se abrem ora se fecham
colho mágoas e alegrias
até o poema se mostrar.

A Trapezista (Carlos Augusto Cacá)

A segurança do palco
não seduz a trapezista
A sua alma de artista
projeta-se para o alto

Se há um risco no salto
há outro na plataforma
viver essa vida morna
no máximo balançar

Porém se quiser voar
e se confia em meus braços
salte para os aplausos
quando eu te colher no ar

Brasília (Carla Andrade)

O tempo e suas longas tranças
debruçadas em varandas com
vista para os olhos da cidade.

A cidade com seus sentimentos
enclausurados em caixas de concreto
pés de aço,
jardins de cimento,
estátuas mijadas.

Você tem que ser híbrido
até seu silêncio dever ser civilizado.
Deixe o que é visceral para
a fotossíntese das plantas.

O que é magistral na sua loucura
para a metamorfose das borboletas

Nada de mudanças repentinas,
enquanto a cidade e seu relógio analógico
decidem seu destino.
Ande devagar, não olhe para os pássaros.

Ária do Amor Desesperado (Chico Porto)

amar
imprescindivelmente
a palavra
disseminada
dissimulada
em teu corpo invicto
eu
o teu leitor convicto

Um Fado Cego (Donne Pitalurgh)

Dei pra dedilhar um fado cego
na guitarra portuguesa do meu medo
e pelo Alentejo eu carrego
d’oliva da manhã, o gosto azedo

O peito enferrujado feito prego.
Heterônimo de dor e azulejo.
Meu amor, eu te amo e te renego
na pessoa lusitana do meu beijo.

Quanto mais mar houvera, mais navego
oceano proceloso, céus, rochedo,
buscador que sou da primavera.

Quanto menos El Rey espera, mais eu chego
noite alta, madrugada, manhã cedo,
na nau catarineta da quimera.

Verde Triste (Ézio Pires)

Enquanto
o verde triste do cerrado
anuncia
o ventre da terra
em
brasa
Anja W3
bate asas...
Eu bato
pernas...
sem ouvir
as cigarras...
que não cantam mais em minha terra...

Desatino (Nonato Veras)

Fique á vontade
a poesia passou por mim ontem, de tarde
hoje, depois do vinho,
sou cavalo de outro desatino.