sexta-feira, 22 de agosto de 2008

Poemas do Zoo Inconsútil- José Edson dos Santos


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A Cobra e o Rato


- Para que realmente tenhas prazer e piedade,
não esqueças quando olhares a noite,
que serei uma estrela de cauda incandescente,
disse o Rato quando era devorado pela Cobra.


A Cobra sem remorso ou comoção
se deliciava com avidez e ironia:
- E serei todo o firmamento
a envolver o teu brilho opaco
e por mais que tentes tersiversar
fatalmente te encontrarás perdido
e nada mais...


O Broxar do Jacaré

Depois de dulcinicamente assassinar o Torquato

na Gargântua dos Duendes Silibrinos

(exercício cínico de criação coletílica)

o Jacaré apresentou

uma diamba capeta

à Sucuri serelepe e multicolorida

e foram beber a lua de úbere

que se desmanchava

na avenida L-2.


Prontamente

a lombra bateu nos sentidos

levando os dois nefelibatas

ao itinerário letárgico

do Grande Circular.


Doida noite desceu

na soturna boca do desvario

pela Asa Norte de sordidez

derrubaram cervas e vodcas

para chatear os infortúnios da virtude

e lembrar que o pecado

morava ao lado da kitchenette kitsch

que servia de studio e alcova.


A noite assobiava sendas e vícios

sob a fuligem dos viadutos e

os aviãozinhos rondavam as mesas

como se dissessem assim com o olhar:

- Olhaí, bacana, tem do branco

e tem do preto, tá a fim?

- Nada disso pau-de-rato!

Quando se paparica uma xotinha

não se perde a oportunidade

impunemente

nem pelo reino da lata!

Contra-ataca o Jacaré de relance.


A Sucuri suspira sua provocação ofídia

antes de dar o bote fatal

segura a mão do Jacaré

e maliciosamente deixa em cima

de sua xuranha orvalhada.


O Alligator de caralho duro

meio desprevenido

dá um uivo de tesão

antes de entrar no jogo

amoroso em pleno bar,


Sexta-feira bastarda

o garçom chega de repente

com a conta para cortar a onda

dizendo que irá fechar.


A Sucuri desapontada e cínica

retoca o batom carmim na boca,

olha o garçom com desprezo

e sentencia lacônica:

- Paga a conta, Jacaré!


Na kitsch kitchenette

o Alligator sob o abajur azul

e o David Sanborn na vitrola

descobre a constatação ululante

um Crocodilo e uma Cobra

sedentos de libidinagem

quando atravessam a madrugada bebendo

acabam ficando um caco sem pique.


Na hora de dar no couro

o Jacaré sente o drama freudiano

e brocha geral.


A Sucuri amuada e sonolenta
se vira de lado

e finaliza decisiva:

- Amanhã, não quero ver mais a tua cara, Jacaré!...
(Do livro Bolero em Noite Cinza, Da Anta Casa Editora. Brasília, 1995)






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