sábado, 26 de março de 2011

Vicente Sá e O Engenho da Loucura



Vicente Sá e o seu parceiro Sérgio Duboc http://nosrevista.com.br
Vicente Sá, natural de Pedreiras, Maranhão, chegou a Brasília em 68 e não pretende sair. Autor de seis livros e muitos poemas que viraram letras de músicas. Tem desenvolvido trabalhos junto o movimento VivaaArte e junto ao lendário grupo Liga Tripa, do qual é letrista e cúmplice. Comentários sobre o poeta:

" Eu sempre gostei da poesia de Vicente Sá. Rápida, rasteira, que a gente entende sem fazer força. A cara dele." Nicolas Behr. "o Vicente Sá, liga a sua usina/ de luares e fantasia./ Parece um diabo velho/ limpando peixe na pia./ Descama novas palavras:/ Peixe em postas de poesias." Aloísio Brandão." "Um dos grandes poetas de sua geração. Tem poesia fácil que aprendeu no cordel e de algumas invenções bem suas." W.Gadelha Neto. "A poesia de Vicente Sá é feito de vento e rapadura: assanha o juízo e adoça o sentimento." Climério Ferreira.

Engenho da Loucura

Tudo é mentira

a dor do amor não dói na gente

dói noutro dia

Já quando a gente é diferente

Já quando tão ausente

vira uma ilha

pensando estar

distante

de quem nos fira

tudo é mentira


Começa leve

o amor é vento e rapadura

e a dor se chega

dor é o cansaço da ternura

feito quem tira tudo

e deixa o CEP da amargura

mas faz um tempo

e o tempo eu sei que tudo cura

que os sentimentos

lá no engenho da loucura

estão fazendo

a vida ser outra doçura

Faça assim por mim

finja que o amor respira

Creia,

tudo é mentira


Alminha

Às vezes eu ando nas ruas

pesado como nos sonhos

com a loucura pousada nos ombros

sinto vontades estranhas

como pequenas alminhas

sugerindo outros rumos

- Vai ser advogado, vai! Ficar dentro de um terno

o dia inteiro nas portas dos tribunais!

- Vai ser morador de rua, vai! Ser dono de nada

num meio de um tudo!

- Vai ser soldado, vai! Passar a vida toda de guarda,

vendo a vida passar!

Tem cada alminha mais sem graça...

Ainda bem que eu sei

que a loucura é coisa que dá, mas passa.


Diferenças

Não sei se as mulheres são de Vênus

e os homens são de Marte

mas sei que há grandes diferenças

de parte a parte

Os homens caminham e espiam

as mulheres observam e desfilam

Os homens fazem sexo e esnobam

as mulherem fazem amor

quando fazem sexo, cobram

E até mesmo na hora da morte

a coisa se diferencia

homens morrem de fome

mulheres de anorexia


Janela

A janela é para se olhar e sonhar

e a porta, talvez por isso,

seja o risco.

Só não deve acontecer é da janela estar fechada

e a porta encadeada


Mas não esquenta não, fogão

fica fria, geladeira


Quando não der mais pé

a gente foge pela chaminé.


terça-feira, 22 de março de 2011

Haikais e a Grande Onda Kanagawa de Katsushika Hokusai




O vento cortante

assim chega o seu destino

barulho do mar


Ikenishi Gonsui


Junco ressequido

dia após dia se quebra

para o rio levar


Takakuwa Rankô


Um corvo pousa

em um galho morto

noite de outono


Matsuo Bashô

terça-feira, 8 de março de 2011

Pierrot Bacante - José Edson dos Santos



O carnaval

esculhamba meu lirismo pacato

A carne cega e fraca

apodrece no delírio

de Baco

estuprando raposas

que não valem rosas

muito menos uvas

do verde vale

do meu ego

A manhã é feminina, e todo dia é dia dela...José Edson dos Santos/ Mulheres de Atenas - Chico Buarque




O mito de Eva nasceu da costela de Adão. Com ela surgiu o pecado original e o mistério que as Mulheres costumam produzir. Nos diferentes ritos da natureza humana, sabe que a vida é uma constante simbiose e que a alquimia de viver, o mais sagrado dos rituais. Clarividente das estações definitivas em perfeita harmonia com os astros e constelações, sinaliza no horizonte das horas o movimento dos ventos, o sentido do sol, da chuva e contempla outros fenômenos da natureza no seu êxtase maravilhoso. Natureza feminina com toda suas conexões.

Emana e vibra com energia, as florestas, os rios e os pássaros do poente. Uma ponte suspensa que leva a aurora boreal em transe. O sol e a lua molduram sua janela de quintessência que amamos. Essa imbricação traduz o presente inesperado em nosso imaginário de amor e morte, de paixão e loucura. A humanidade conhece a substância de seu tecido onde tece o vestido de sua ternura.

O perfume embriagador e fatídico de sua presença ao lado do homem, concebeu a vastidão e a geografia inusitada do mundo: Cleópatra, Lou Salomé, Anais Nin, Frida Kahlo, Olga Benário, Pagu, Luz Del Fuego, Elvira Pagã, Marisa Montini. São tantas outras que somam a luta de todos os dias por entre conquistas e sonhos, dos dias e das noites que testemunham e sinalizam o mistério prodigioso de sua existência.

Na diversidade cultural incomensurável, são tantas outras costelas: são putas, donas de casa, peruas, empresárias, beatas, porras-loucas, professoras e operárias. Imprescindíveis, no entanto, as mulheres que buscamos para complementar afeição e carinho que tanto procuramos com obsessão. Como disse o cronista, Deus criou o mundo em seis dias, no domingo descansou e na segunda criou a Mulher. Eternamente Mulher. Maravilhados tentamos entender o universo em seu corpo. Outra dádiva de Deus.

sábado, 5 de fevereiro de 2011

Varal com 3 poetas amapaenses com Marabaixo Batuque de Olivar Cunha



Marabaixo - Batuque, de Olivar Cunha
http://olivarcunhaarte.blogspot.com/

Alcinéa Cavalcante (Jornalista, professora e escritora. Publicou dois livros de poesia: Estrela Azul e Dez Poemas. Em 2008 publicou com Rostan Martins dois livros de causos: Sambou e Zero Voto. Publicou em 2008 Varal, com Rostan Martins e Osvaldo Simões. Participa da Coletânea Poetas, Contistas e Cronistas do Meio do Mundo. Blogueira da arte e cultura amapaense em http://alcinea-cavalcante.blogspot.com )

Noturno

A noite
eu vigio estrelas
Me embriago
de amor e luar
Passeio com Hemingway em Paris
Visito os becos de Goiás
com Cora Coralina
E com Quintana
tento descobrir
o que é que os grilos
passam a noite inteirinha fritando

Dormir
é bom de manhãzinha
Quando o sol
- ainda tímido –
pula minha janela
pra me ninar

UM

Se eu soubesse
rezar verso
esta saudade
não estaria doendo tanto
como a dor
de não ser pássaro
para flutuar no azul

DOIS

Com as cordas
do violão
fiz um
varal de poesias
e pendurei
nas estrelas

E a noite
encheu-se
de música e versos

TRÊS

Já viu, meu amigo,
uma bailarina
que não baila?

Essa aí
fica o tempo todo
na minha estante
brincando de estátua

Oswaldo Simões Filho (Jornalista e poeta, autor de “Lamento Ximango”. Publicou em 2008 Varal, com Rostan Martins e Alcinéa Cavalcante. Participa da Coletânea Poetas, Contistas e Cronistas do Meio do Mundo. Tem livros inéditos de poesias e contos. Vive no império dos fatos e no jardim da imaginação).

Bares

canta galo
que o vico ouviu
um reclame no bar
de caboclo embarcado
em merengue...

na hora em que passou
pela esquina um gato azul
o poeta soletrou
em mãos carinhosas
o futuro no café society

a cabocla jarina baixou
no canto da parisiense
e da noite mal criada reclamou...

du pedro fez preces
aos três padroeiros
para o barrigudo
continuar a fazer
carnaval na rua...

Marés dos dias

No rio
de nossa infância
passa saudade
carregando cidade
onde umbigo ontem enterrado
hoje faz visagem

No rio
de nossa infância
para se remar
precisa ter coragem
pois é preciso atravessar
quintal de lembranças
descer ladeira
no falatório da vizinhança
fazer prece em corredeira
para menina
embrulhada em camisola
onde uma vontade
se enrola

Natural

O rio
não tem farsa
é água
que enche
que vasa
como a vida
que vem
e que passa

Rostan Martins ( Poeta, escritor, radialista, arquiteto, professor universitário e mestre em Semiótica. Autor do livro Alô, alô, Amazônia. Em 2008 publicou com Alcinéa Cavalcanti dois livros de causos: Sambou e Zero Voto. Em 2008 publicou hai-kais poéticos em Varal, com Alcinéa Cavalcante e Osvaldo Simões Filho. Participa da Coletânea Poetas, Contistas e Cronistas do Meio do Mundo. Blogueiro em http://rostan.zip.net

Ao Marabaixo

Vou roubar “ladrão”
na derrubada do mastro
Gengibirra faz lastro.

Faz cair pedaço
na nuvem da murta
caldo e cachaço.

O que tu esconde?
Saia rodada? Só paixão,
nos teus coxões?

O som dos caixeiros
é o bambolear das nádegas
das marabaixeiras.
Cortação do mastro,
homem, natureza e cultura,
junto no lastro.

À Macapá

Veja a brincadeira.
esmigalho amendoim,
pelada na beira.

Moleque empina
o pássaro preto
pipa de quina.

Vem rio em rio
assistindo a proeza
Amazonas no cio.

Parte da gente,
ardente na mente.
Amor contente.

Torrão beleza,
adorável paragem
e singeleza.

Apetitoso.
lugarzinho ditoso,
talhe gostoso.

Galanteio
gabo e elogio,
reclamo e odeio.

Quem amará:
Macapá com amores,
sem prejudicar.

Tuas chuvas, heim!
Gota cai, barulha.
A parte de nós.

sexta-feira, 7 de janeiro de 2011